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Adrão e o Ventor

Eu nasci na serra de Soajo e Adrão, nas suas encostas, é o meu berço

Adrão e o Ventor

Eu nasci na serra de Soajo e Adrão, nas suas encostas, é o meu berço

Nasci em Adrão e, desde muito novo, iniciei as minhas caminhadas pela minha serra - a serra de Soajo. Em 2009 ouvi falar de uma cruz que tinha sido colocada no Alto da Derrilheira. Numa caminhada realizada com os meus companheiros e amigos da serra de Soajo, Luiz Perricho, António Branco e José Manuel Gameiro, fomos recebidos no nosso mais belo Miradouro como mostra esta foto.


Algumas das vacas da serra, receberam-nos e, na sua mente, terão dito: «contempla Ventor, mais uma vez, toda esta beleza que nunca esqueces. Este é o teu mundo e é nele que o Senhor da Esfera te aguarda». Tem sido sempre assim, antes e depois da Cruz.


Se quiserem conhecer Adrão, Soajo e a nossa serra, podem caminhar pelos meus posts e blogs. Para já, só vos digo que fica no Alto Minho.



Depois? Bem, depois ... vamos caminhando!


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Aqui nasce o rio Adrão


Das melhores coisas da minha vida, foi caminhar no rio de Adrão. Até aos 15 anos e depois, à medida que por lá ia passando. Nesses tempos eu caminhava no meu rio como caminho hoje por muitos trilhos limpos.

 

O rio Adrão nasce aqui e vai perder-se enleado em matagais sem fim


11.02.07

A Transumância


Ventor

O Ventor fala-me de Transumância. A transumância dos gados de Soajo e de Adrão, da serra de Soajo para a serra da Peneda na segunda metade do verão. Ele conta-me tudo!

 Este era o Poulo de Adrão na serra da Peneda

Era neste local, em redor do Poulo de Adrão, que a malta de Adrão tomava conta do seu gado e o mantinha controlado por ali, para que não fosse roubado por estranhos, nem atacado pelos lobos que, antigamente, podiam atacar os vitelos e não só. Nos anos 50 ainda haviam bastantes lobos nas nossas serras.

Uma manhã de Agosto de um ano da Graça do Senhor da Esfera, muito cedo, o Ventor, ainda pequeno, vinha da lavoura da veiga com uma braçada de ervas e alguns pés de verde milho partidos, para alimentar uma vitela que se chamava Nova. Ao chegar à fonte do Cabo do Eido, atravessou à sua frente uma manada de vacas desconhecidas e, entre elas, um grande boi. Era o “boi das vacas” de Soajo. Era assim que ele era conhecido pelos de Adrão, e o Ventor ficou muito admirado de ver ali o boi de Soajo. O Ventor conheceu-o, logo, porque o tinha visto junto à casa florestal do Vidoeiro, quando a malta de Adrão foi autorizada pelo Guarda da Floresta, o seu amigo Martins, a levar o gado para a área florestal dos montes que se debruçam sobre Bordença. Era um bom boi e perguntou aos dois homens que matavam a sede na fonte e as orientavam, porque andavam ali as vacas das gentes de Soajo.

 A Naia  

Esta foto, representa a Naia, hoje atravessada por aquele estradão que pretende chegar até aos Poulos do Muranho, o local oposto à serra da Peneda, o outro planalto em frente.

Eles disseram-lhe que as vacas iam para a serra da Peneda para os lados de castro Laboreiro. O Ventor, sempre que ouvia falar em Castro Laboreiro só lhe vinham à mente os cães daquela região e o seu Jolim, um cão que seu pai teve quando ele era pequenino. De resto calculava que devia ser tudo igual.

Os carros de bois, as vacas, as ovelhas, as mulheres vestidas de negro, pelos que norriam e pelos que se metiam audaciosamente nos caminhos de França. Pelos caminhos da aldeia andariam as galinhas e os porcos e caminhariam, à frente das suas gentes, as vacas e as ovelhas. Não haveriam grandes diferenças! 

Mas o Ventor só sentiu a força da transumância quando o seu amigo, o Joaquim Brasileiro (que o Senhor da Esfera o tenha a seu lado, pois veio a saber que faleceu), lhe veio dizer: «Ventor, amanhã não podemos ir às trutas». “Não podemos porquê”? – Perguntou-lhe o Ventor.

“Amanhã vou com o meu pai ou com o meu avô, ainda não sei, levar as vacas à Peneda, porque os de Soajo já aí vão com elas e as nossas vão ter de descer da Naia e pôr-se a caminho”!
 
Estavam em Agosto e os montes secos e com pouco comer. Iria começar a grande caminhada rumo à serra da Peneda, aos Montes Laboreiro. Nessa época o Ventor ainda era muito pequeno para perceber tudo o que se passava à sua volta, mas sabia que os de Adrão se revezavam na sua vez de guardar os gados que iam para os montes da Peneda. Era a vezeira!
 
 
Fraga da Nédia
 
Esta é a base sul-sudoeste da serra da Peneda. A grande fraga, em frete, é conhecida por Fraga da Nédia. Quando era miúdo, havia uma história que contavam sobre duas meninas que ali morreram. Elas eram duas irmãs, pastorinhas que andavam naqueles monte, e foram para o topo daquela fraga pentearem-se uma à outra. Depois, na brincadeira, uma caiu e agarrou-se pendurada num penhasco, pediu ajuda à irmã que lhe foi dar a mão e caíram as duas pela fraga abaixo. Era uma boa chamada de atenção para todos aqueles que se aventuravam por recantos que não deviam. E era eficiente, pois no meu caso, lembro-me sempre delas.
 
A vezeira era formada por gados de várias pessoas que durante algum tempo, normalmente semanal ou quinzenal, era guardado por duas ou três pessoas, que se iam revezando durante o tempo que as vacas parassem, neste caso, pelos lados da serra da Peneda.
Aí o Ventor sentiu a estucada da serra vizinha. O seu amigo iria tratar dos seus afazeres para levar as vacas rumo à Peneda e a pesca das trutas ficava para mais tarde. Diz o Ventor: - “Eu andava sempre com a ideia de me afoitar em ir até à serra da Peneda, até Montes Laboreiro e apreciar aquilo tudo, de que o meu pai me falava, mas por várias razões, nunca aconteceu. Era uma boa estirada para fazer só e a tempo. Não sei se os riscos seriam grandes ou pequenos mas eu gostava de correr riscos».
 
 
 
Mãe e filho, continuam a dar vida às minhas Montanhas Lindas
 
«No entanto, aos 15 anos, parti rumo a Lisboa e só alguns anos mais tarde tive oportunidade de conhecer Castro Laboreiro e os penhascos daqueles montes que, para mim, seriam diabólicos, atendendo às observações que fazia da Fraga da Nédia que olhava com muita atenção a partir da Portela de Baixo e, também, quando caminhava pela Naia, rumo ao Muranho e à Pedrada. Nessa primeira caminhada por Castro Laboreiro fomos de Lisboa pelo Gerês, entramos em Espanha pela Portela do Homem, atravessamos umas aldeias espanholas e entramos em Portugal pelos lados de Castro Laboreiro. Foi uma bela caminhada, mas já chegamos tarde e não deu para ver grande coisa pois ainda queria ver as minhas montanhas lindas com dia».
 
 
 
Elas são tão lindas que merecem todo o nosso cuidado. São mesmo as Rainhas das Montanhas
 
«Não tendo tido oportunidade de participar na última das transumâncias do meu tempo, resta-me recordar as dificuldades que a minha gente tinha, nesses tempos, para levar de vencida a sua caminhada neste mundo. Hoje, creio que não haverá ninguém a levar de Soajo ou de Adrão ou de qualquer outra aldeia, os seus gados para os Montes de Castro Laboreiro ou arredores. Mas numa conversa, em Adrão, com a irmã mais nova do meu amigo Joaquim, a Fátima, fiquei a saber que foi o seu pai o último homem de Adrão a levar as suas vacas da serra de Soajo para a serra da Peneda e que ela, terá sido a última mulher a partilhar esse trabalho, ajudando-o».
 
 
Agora temos trilhos de asfalto, mas os dos nossos gados são inesquecíveis
 
Quando as Primaveras eram quentes, as vacas, começavam a subir mais alto pelos fins de Maio e pelo mês de Junho as noites aqueciam e elas começavam a perder a vontade de vir para as cortes. Começavam por ficar pelos Poulos da Chãe do Boi, depois pela Naia e de seguida começavam a ficar pelo Muranho até se afoitarem a subir à Corga da Vagem, ao Curral do Pai, à Seida por onde ficavam todo o verão, ou então, algumas delas eram levadas para a Peneda pelos meados de Agosto. O gado rapava as montanhas da serra de Soajo e, a partir dessa altura, havia famílias que tinham por tradição praticar a transumância para a serra da Peneda, onde havia mais comer, e lá, por fins de Setembro e às vezes já no Outono, as vacas regressavam da serra da Peneda bem gordinhas, sendo algumas levadas para as feiras dos «Primeiros de Soajo», onde, a sua venda renderia mais algumas «notas». Notas de 100$00 (cem escudos).
 
 
A vossa pose é majestática
 
«Esta era mais uma das formas de viver das gentes de Adrão e Soajo, até ao último quartel do século XX. As vacas rumavam à serra da Peneda e os seus donos acompanhavam-nas, revezando-se, abrigando-se dos lobos, das noites frias e das chuvadas, nos célebres «iglos de pedra» - os nossos Cortelhos. Nos cortelhos eles faziam o velho «caldo d’unto», para lavar as tripas (como diziam então) e comiam o bacalhau, muitas vezes contrabandeado de Espanha com pão de milho e, sempre que possível, pão com chouriço e presunto que, nessa altura do verão, nem sempre havia. Mas, a Espanha era ali ao lado».

 

Os iglos de pedra são os nossos verdadeiros monumentos

«Depois veio a nossa Diáspora em grande escala, com a ida dos homens para França e depois daqui para a América e não só, ficando apenas as mulheres que, de seguida, começaram também a sua partida para mundos que só ouviam falar. As aldeias esvaziaram-se de gente, de animais, de tudo! Na prática, em muitas delas, pouco mais ficou que as ossadas daqueles que partiram para a última viagem. O resto já todos sabem».


As Montanhas Lindas do Ventor, são as montanhas da serra de Soajo, da serra Amarela, do Gerês, ... são as montanhas dos meus sonhos e são, também, as montanhas de toda a minha gente

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