Em 10 de Agosto de 2011, fiquei a conhecer mais Soajo!
Saí da Casa do Povo, onde bebi o café, rumo a Adrão. A pé, claro!
Desta vez, de facto, conquistei mais Soajo. Conheci o Souto, a Casa do Souto, os campos do Souto, os caniços do Souto, as águas do Souto, os caminhos do Souto, as flores do Souto, ...
Pois foi! Conquistei mais Soajo. Voltei a ver o meu amigo João, a minha prima Helena que, em Soajo, em tantos anos, só tinha visto uma vez! Recuperei num dia, anos perdidos, anos que ficaram encostados numa esquina do tempo. Mas nunca é tarde! Nunca é tarde para rever o meu amigo Carrasco na fisionomia da sua 2ª filhota. Consistem ali, as pintas do pai e da mãe. Tive também o prazer de vir a conhecer a sua filhota, que, há tanto tempo que anda por este mundo e nunca a tinha visto, mais a sua netinha.
Apetecia-me falar do Paquistão, neste momento, mas vou continuar com Soajo!
Na Corga das Ínsuas, alguém colocou esta telha para apanhar água na nascente. O melro é um cliente
Também conheci mais Soajo porque não me limitei a seguir o velho caminho, rumo a Adrão. Mais pela direita ou mais pela esquerda, haveria sempre uma forma de chegar rápido, ao Areeiro. Esticar a perna e avançar sempre! Depois, seguir o caminho de Bordença, rever a sua ponte e rumar ao Senhor da Paz e, dali, ao Cemitério. Seria a "peace of cake". O meu amigo "Finitro" tinha-me preparado para isso!
Mas eu sou anti-trilho! Coloquei os olhos no ar e fui por onde as andorinhas me levaram. Só que, depois, fui desencaminhado pelos corvos e pela poupa. Todos me chamaram e eu fui! Eles disseram-me que o mundo deles também era o meu! Devem ter aprendido com o galego que um dia, em Padrão, me disse que os minhotos eram uns corvos. Por isso, deixei-me levar sob os auspícios de Apolo, na peugada dos corvos. A poupa dirigiu-se em minha direcção, pousou sobre um pinheiro e tentou desviar-me para o caminho certo. Não conseguiu!
O caminho, este, tinha por objectivo levar-me para a Encosta das Vacas
De repente, decidi esquecer os corvos. Olhei para o lado e, ali estava a estrada para Adrão e, vinda de cima, de Entre-os-Outeiros, descia encosta abaixo a velha estrada florestal. Desviei-me para a corga das Ínsuas, saltei valados e desci entre paredes até à corga onde um melro, deu uma grande gargalhada e me perguntou: "e agora, Ventor"?
Achei que estava a gozar comigo mas não! Olhei a corga sem rasto de ninguém e fiz os meus olhos penetrarem na sombra da corga que ali corria sob árvores. Em plena sombra, mais em baixo, uma telha apanhava água que nascia ali para alguém beber mas, verifiquei que o único utente estava a ser o melro.
Virei-me para trás e as duas paredes tão íngremes, mais me pareciam o Fojo do Lobo e o lobo no buraco era eu. Não me meti à corga para me chegar à telha e fazer companhia ao melro. Para a frente não era bom e para trás era mau. De qualquer modo teria de subir bem e, então, resolvi seguir em frente. À 3ª tentativa passei a corga para o outro lado e iniciei a subida oposta à descida que tinha feito. Dei umas passadas rasgadas para não perder o balanço e uma silva entre as ervas tentou deter-me. Rasgou-me a pele, no peito do pé, junto à pala do sapato. Sapatos de toilette sem meias! Meto-me em cada uma!
Mas lá fui entre duas estreitas paredes até um caminho que cavalguei como pude até às Ínsuas, onde partia o trilho para Adrão. Passei o pontilhão em direcção a Soajo, onde um indivíduo regava umas plantas com uma mangueira junto à casa. Perguntei a esse homem se sabia onde morava o Joaquim Neto. Ele disse-me que ele tinha por ali uma casa mas morava em Soajo. Quase lhe pedi uma mangueirada o que teria feito se não fossem as máquinas, mas perguntei-lhe se os trilhos por ali estariam razoáveis para seguir rumo ao Areeiro.
"Para o Areiro volte para trás, porque se esse não presta, com os outros não se safa"!
Estas ovelhas, foram minhas companheiras de caminhada, enquanto eu ainda tinha objectivos
E não safei mesmo! Segui para o monte, creio ser a Encosta das Vacas, ou Costa das Vacas, para tentar ver a Açoreira de frente. Vi-me e desejei-me, primeiro para entrar para onde queria e o pior foi sair depois. Tive que trepar rente ao solo por entre os troncos das giestas, onde fiz ginásticas incríveis entre giestas queimadas e giestas verdes que me iam penteando como podiam.
Por fim disse para os meus botões que ia desistir. Foi o que fiz. Tracei um rumo em direcção do Areeiro e iniciei grande subida. Sob um calor escaldante, sem água, sem chapéu, sem cajado, sem meias nos sapatos e com uma sede terrível, tocou o telélé. «Luis, onde estás»?
Não me recordo se disse que estava no Inferno mas não terei dito para não a preocupar. O meu coração parecia uma MG a fazer fogo! Cada sombra que via queria encostar! "Não, não há encosto. Temos de seguir, sem perder pedalada, senão ficamos aqui»!
Por entre as giestas, queimadas ou verdes, não conseguia tirar fotos para as partes fundas da Assureira. Só fazia "fogo" alto (clicava), com uma mastronça de uma Canon nova, com a qual não sabia trabalhar. Mas, aprenderei!
A caminhada respondia às incertezas do gajo! Mais devagar, mais acelerado, mais devagar, mais ... mas sempre a subir! Por fim, encontrei os trilhos que me levariam ao Areeiro e em terrenos a ficarem quase planos. Avistei as árvores em volta da velha casa florestal do Areeiro, algumas, se nunca arderam, ainda eu terei plantado. Durante a chamada, disse ao meu Malmequer que, quem chegasse primeiro, esperava no Areeiro. Eles estavam nos Arcos e não sei que tempo demorariam, porque não sabia a que horas sairiam de lá.
Penetrei no arvoredo do Areeiro, o meu Purgatório! A beleza de árvores lindas e de sombras frondosas mas, e a água? Não tinha água. Tinha saído do Inferno e já em passada normal, peguei no télélé e, ... "esse número não se encontra atribuído"! Maldita TMN, ... faz-me mais falta um telemóvel aqui um dia que o resto do ano todo, em Lisboa. Outra chamada, a mesma resposta. Utilizei outro número. Entre três telemóveis podia ser que apanhasse algum. Duas chamadas e número atribuído mas era espanhol. "Buenos dias"! Duas respostas, duas desculpas. Vou tentar o terceiro número, ... «Ah! Desisto! Ainda me aparecia um espanhol e já estava sem paciência».
Lá está o Barroco! Que saudades tenho de galgar aqueles montes. Cá para baixo sombra e sol de frente - desisti. Queria era a casa do Areeiro
Desisti de dizer uma coisa simples. Vou continuar por Bordença, esperem-me no Senhor da Paz! Mas, como não liguei e, para não ficarem à minha espera no Areeiro, desisti da caminhada. Tudo por falta de telemóvel. Fiquei ali no Purgatório, esperando. Por fim lá vejo um argolinhas branco. Devem ser eles. Tenho de ir beber água a qualquer lado, pensei. Mas não foi preciso. Chegava, pelas mãos do meu Malmequer, desde os Arcos, uma garrafinha de cerveja ainda gelada. Essa garrafinha amainou as hostes e lembrei-me do meu amigo Odin e da sua fábrica de cervejas no Vallala. Acabou o Purgatório e entrei no céu! Rumo ao Miradouro, em Castro Laboreiro, onde o verdinho das Muralhas fez o resto do trabalho.
Mas passei quatro cortelhos trogloditas que me levaram a entrar por velhas realidades
Mas não foi uma caminhada inútil! Ajudou-me a descobrir, de facto, mais Soajo. A caminho da Costa das Vacas, encontrei quatro cortelhos trogloditas. Lá dentro era só escuridão mas, num deles, no segundo, estava uma galanta, uma bela rainha das montanhas, num trajecto diferente do meu. Eu caminhando, ela descansando. Mas gostei de ver aquela galanta! «Oh, Galanta! Estás aí na fresquinha»? Ao falar com ela, ela parecia que me conhecia. Deu duas passadas para sair do cortelho e eu disse-lhe para ficar à fresquinha. E não é que deu os dois passos para trás e ficou sossegada a remoer!
Ali lembrei-me dos trogloditas de Marrupa. Uma palhota subterrânea debaixo da terra de milho. Ouvíamos vozes e só víamos milho. Cansados, cheios de sede, tínhamos de subir aquele campo de milho para vermos para que lado ficava o Aeródromo. Mandei os meus parceiros ficarem quietos de armas em riste e eu, mais à frente, encaminhei-me rumo às vozes que ouvia mas, só via o milho. A G-3 bem apertada, pronta a cuspir fogo. O 2º avançou para me proteger melhor e para trás ficaram dois prontos a abrir fogo. Debaixo do chão as vozes continuavam. Pensei num abrigo de turras! Estaríamos a 10 kms da Base e outros 10 do Exército. Das profundezas do milho sai-me uma velhota com uma criança nos braços assustada quando vê a metralhadora virada para ela. «Não tenha medo que não lhe fazemos mal. Estão homens aí»? "Não, estão a trabalhar, só estamos nós e a criança"! Penso que eram duas ou três e tudo terminou em bem. Tal como eu e a galanta!
Aqui, esta galanta, quis colaborar comigo! «Eu saio e vou à frente abir caminho, Ventor». São espertas as rainhas das montanhas!
Não sei se alguém conhece a história do "Quatro Olhos". Quando eu era miúdo, constou-se, em Adrão, que um homem a quem chamavam, Quatro Olhos, tinha morto outro. Não sei se era de Soajo ou se eram de Soajo, ou se esse Quatro Olhos se foi esconder a Soajo. O fulcro da História era que a gente de Adrão tinha medo de fazer as viagens sós, entre Adrão e Soajo e vice-versa, que o Quatro olhos andaria por ali, escondido nuns cortelhos. Se fossem aqueles cortelhos seriam, de facto, um bom esconderijo! Hoje, aqui, sentado no meu computador, apeteceu-me tentar retratar esta caminhada de sonhos, não concluída. Haverá outra, sei lá quando, mas a rigor!
Quando, farto de andar com a cabeça no ar à procura de nada, virei à Branda da Murça e senti uma frescura amena ao entrar nestas árvores. O calor e a sede, minavam-me por dentro
Aqui, à sombra fiz várias tentativas para prosseguir viagem mas, os telemóveis, nas nossas Montanhas Lindas, são uma decepção. Fiquei neste Purgatório um tempinho, numa frescura agradável e o céu só chegou com uma cervejinha frsca, vinda dos Arcos